Contratos sem licitação de aluguel e compra de ambulâncias no Piauí são permitidos?

Após a repercussão nas redes sociais de que o governo do Estado teria pago uma página inteira na Folha de S. Paulo, no início desta semana, ressaltando medidas que vêm sendo adotadas para reduzir impostos da Covid-19 na economia, o governador Wellington Dias (PT) foi alvo novamente de acusações. O anúncio do aluguel de 10 ambulâncias a um custo de R$1.104.000,00 e da compra de mais 30, nesta quinta-feira (16), provocou mais uma enxurrada de comentários negativos quanto à forma como a gestão estadual está administrando o dinheiro público.

Diário oficial publicado no dia 13 de abril

De fato, a informação é verdadeira, tendo sido publicada no Diário Oficial do Estado na segunda-feira (13). Conforme informações coletadas no site da Secretaria do Estado da Saúde do Piauí (Sesapi), serão cinco ambulâncias do tipo B (Ambulância de suporte básico) e cinco ambulâncias do tipo D (Ambulância de suporte avançado).

O custo mensal das dez ambulâncias será de 184 mil reais para transporte de pacientes infectados aos hospitais interestaduais. A empresa contratada oferece serviços de ambulância para o Piauí desde 2013.

A empresa é a Costa Assistencial LTDA, inscrita no CNPJ 25.529.733/0001-49, com o nome fantasia Sulcare Servicos de Saúde. A COAR investigou mais a respeito da empresa e descobriu que ela tem sede em Taquari (RS). A Costa Assistencial é uma empresa polivalente, que atua em diversos ramos. O primeiro negócio da empresa, uma funerária, existe até hoje.

Mas a organização tem atuação em outras atividades: treinamento em desenvolvimento profissional e gerencial; locação de automóveis sem condutor; comércio varejista de artigos médicos e ortopédicos; serviço de transporte de passageiros – locação de automóveis com motorista; aluguel de equipamentos científicos, médicos e hospitalares, sem operador; atividade odontológica e aluguel de material médico.

No entanto, a imagem de uma ambulância da Renault Master L1h1 Simples Remoção viralizou nas redes sociais, provocando questionamentos, já que o suposto conteúdo informa que o valor de uma ambulância 0 Km é R$ 129.00,00. A COAR encontrou a mesma imagem no Mercado Livre, mas o governo do Estado não informou, especificamente, qual a marca das ambulâncias locadas, nem em matérias ou em Diários Oficiais.

A COAR tentou encontrar mais informações no site da empresa contratada, porém existe apenas uma página da funerária no Facebook. A COAR também tentou por diversas vezes entrar em contato com a Costa Assistencial para saber mais informações sobre as marcas dos veículos, embora em uma imagem verificada em um site do Rio Grande do Sul, nossa equipe encontrou ambulâncias da fabricante Fiat. A COAR ressalta que a matéria é de 2018, veículos de outras fabricantes podem ter sido contratados ou não.

A suposta imagem atrelada às ambulâncias da empresa contratada

Para se ter uma ideia do custo mensal de locação no mercado local, a COAR entrou em contato com uma empresa que presta serviços de locação de ambulâncias. Segundo informado pela empresa – que pediu para não ser identificada-, o valor mensal de uma ambulância do tipo B é por volta de R$ 8 mil, enquanto que a de categoria D é de R$ 10 mil. Embora esses valores possam variar de empresa para empresa, inclusive devido os equipamentos serem diferenciados.

O Diário oficial também informa sobre o valor de R$ 1.056.000,00 para aquisição de material de higiene pessoal para população de baixa renda, com dispensa de licitação emergencial.

Processos licitatórios: onde está a transparência?

Muitos usuários piauienses, inclusive portais locais, questionaram a falta de um processo licitatório para seleção da empresa contratada. O Diário Oficial do Estado releva que o contrato de locação de ambulâncias tem fundamento legal no art. 4º da Lei nº 13.979, de 06/02/2020, que trata da dispensa de obrigatoriedade de licitação para aquisição de bens e serviços em casos de emergência e de calamidades públicas (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020).

A pós-doutoranda em Direitos Sociais e Humanos pela Universidade de Salamanca (Espanha), com experiência em Licitações e Contratos Administrativos, Naiara Moraes, explica que todos os órgãos jurisdicionados pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) têm a obrigação de divulgar as dispensas de licitação em 24h no site.

“A lei da Covid (13.979 – 06/02/2020, que também é mencionada no Diário Oficial), obriga que se informe em site oficial, após a efetivação de qualquer compra”, esclareceu. Ainda de acordo com a professora, a nova lei também abre brechas para contratos com preços mais elevados. “A lei traz várias flexibilidades, inclusive na contratação de empresas inidôneas. Permite também que se compre com valor maior do que em compras iguais anteriores, considerando o aumento de preços desse período”, comenta Naiara Moraes.

O parágrafo § 3º da Lei, citado pela Naiara Moraes, informa: “Os preços obtidos a partir da estimativa de que trata o inciso VI do caput não impedem a contratação pelo Poder Público por valores superiores decorrentes de oscilações ocasionadas pela variação de preços, hipótese em que deverá haver justificativa nos autos”.

Denúncias da SIMEPI

Em vídeo divulgado nas redes sociais, o presidente do Sindicato dos Médicos do Estado do Piauí (SIMEPI), Dr. Samuel Rêgo, denuncia os altos gastos do governo. E inclusive cita sobre a UTI construída e abandonada no Hospital da Polícia Militar do Piauí, que poderia ser utilizada no combate à pandemia. A diretoria já havia feito a mesma denúncia em julho de 2019 e cobra atenção dos governantes quanto aos leitos para tratamento dos pacientes com Covid-19.

O presidente do Sindicato dos Médicos do Estado do Piauí (SIMEPI), Dr. Samuel Rêgo

156 milhões?

Recentemente, o governo do Piauí divulgou uma tabela amadora, onde listava os gastos de cerca de R$ 156 milhões.  Segundo informações oficiais do governo, os recursos foram aplicados em exames, aquisição de Unidades de Terapia Intensiva, chamamento de pessoal e outras ações de prevenção da pandemia.

A tabela amadora do Governo do Estado

Diante da repercussão dos gastos, o Ministério Público do Estado do Piauí (MP-PI) pediu para que a Secretaria Estadual de Saúde (Sesapi) fosse mais transparente quanto às ações no combate ao novo coronavírus. O MP ressalta que é obrigação da gestão atual ser mais transparente na publicidade de gastos.

Casos de Covid-19

O Piauí tem mais de 100 casos confirmados de Covid-19, segundo boletim divulgado nesta quinta-feira (16). Os casos confirmados foram: Teresina (86), Campo Maior (1), Caracol (1), Parnaíba (1), Pimenteiras (1), Piracuruca (4), São José do Divino (3), Bonfim do Piauí (1), Altos (1), Picos (1), Inhuma (1) e Demerval Lobão (1).

Custo Piauí

O projeto Custo Piauí, criado em 2018, é uma plataforma virtual, onde o cidadão piauiense pode encontrar informações detalhadas sobre uso do orçamento público. “No site, são apresentados de maneira simples e didática, os gastos de vários órgãos públicos, incluindo o Governo do Estado do Piauí, o Tribunal de Justiça do Piauí e a Câmara de Vereadores da Teresina”, informa o criador da iniciativa, o advogado André Portela.

Escrito por: Marta Alencar e Igor Macêdo

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